sexta-feira, agosto 19, 2005

TRABALHADOR ASSALARIADO


Seu Geraldo é mais um entre esses milhares de brasileiros que dedicam oito horas de seu dia para o trabalho, duas para chegar até ele quando o trânsito está normalizado, e mais duas para voltar. Para sua família, no fim do dia, sobram onze horas, pois desconta-se mais uma hora de almoço na empresa. Sobram onze.
De onze, sete ele dedica ao sono. Esta certo que às vezes bem menos, acontece quando tem que trabalhar à noite. Mas seu Geraldo não se importa com isso. Essas coisas acontecem e mesmo com frequência é melhor que aconteçam algumas horas a mais do que não acontecer nenhuma hora.
Todo esse esforço de seu Geraldo é para continuar sendo um: ASSALARIADO. Do português: “às- pessoa exímia em sua atividade”, ou seja: excelente no que faz. Ou, do inglês: “as- como; tão; igualmente”. Pois bem, assim como todo brasileiro, embora o dicionário tenha invertido, Geraldo é batalhador e sua jornada e importância no trabalho se iguala aos outros aventureiros dessa selva.
Geraldo, “as” muitos brasileiros, também esperam o mês inteiro – e até espera várias vezes por mês quando o orçamento aperta - ansioso para ver em suas mãos seu salário. E por uma estranha ou quase clara razão seu Geraldo reclama, desespera-se e lamenta quando o tão esperado chega.
Difícil é entender porque chamam seu Geraldo de assalariado. Salário é o que se paga em dinheiro por um serviço prestado. Diga-se de passagem: quanto serviço! Mas, se não pagam o devido valor de um serviço prestado, sendo o valor representado apenas por alguma pequena porcentagem do que realmente seria o montante, salário não deveria fazer parte do nome. Não o representa por completo. Assalado seria uma seguestão que cairia bem. Juntando nosso português com a influência de línguas estrangeiras, como o Inglês, percebemos todo o porquê do emprego da nova palavra:
“As: pessoa exímia - como as outras”, soma-se “sala: compartimento de uma habitação” e junta com “ado: pessoa que sofre a ação”. E como sofre...
Uma professora de primário me disse que antigamente os salários eram pagos com sal, e não dinheiro. Se antigamente fosse como hoje, não sei como a palavra salário foi mantida, pois: salário sem sal, sobra apenas ário... ou seria árido? Se hoje fosse apenas árido, ou melhor: ário, poderíamos entender melhor a vida dos nossos assalados... ou seria assolados?
Embora um salário não seja um bom sustento, Geraldo continua a dedicar quase o dia todo para não perde-lo no fim do mês, pois muitos brasileiros tem uma vida muito mais árida sem o trabalho, sem sal. Antes fazer parte do grupo dos assolados à desolados.
Seu Geraldo hoje é um viciado. No começo, ia para ao trabalho contente, fazendo com que seu serviço dependesse dele para sobreviver. Queria sempre ter mais serviços e mais difíceis. Cargos mais altos. Era dono de si e dominava o que fazia. O tempo foi passando e Geraldo foi se cansando, mas a quantia recebida foi-se aumentando.
Cansado e alienado. O vício foi tamanho que hoje Geraldo só sabe viver se for com ele. Com um salário cada vez mais forte, não consegue parar de trabalhar, se vende, troca a família, desfaz de seus maiores valores pessoais para que no fim do mês, apenas um único dia, contentar-se com o resultado. Suas horas de lazer foram substituídas. Lazer para ele é receber o salário. Hoje é só trabalho e amanhã também!
Assalariado, assinado, assaltado, assentado, assolado... Desolado.
Nem se lembra quando foi a última vez que fez planos para mudar seu ritmo.

Da mesma série de "Produções de texto do Colegial"

2 comentários:

G.G. disse...

Passou de 2 parágrafos perdeu o comentário.

Anônimo disse...

Gostei dos trocadilhos, foi muito criativo!