domingo, abril 08, 2007

Sexta-feira santa em Americana

Vou descrever pela décima vez o que aconteceu. Não estou mais chocada e isso não choca quem ouve, só quem vive ali. Acabamos de comer no habbibs, eu e minha mãe. Quando um estrondo de batida muito forte acontece na mesma direção, do outro lado da avenida. Todos olham apontam e dizem: nossa. Em poucos segundos milhares de urubus, curiosos e festeiros estavam lá. Como enfermeira, minha mãe foi na frente tentar ajudar. Eu paguei a conta e fui em seguida. Atravessando a rua a cena que eu vi foi: uma menina jogada no chão, entre a calçada e a rua, outra há uns 5 metros na frente, uma perna de uma pessoa em baixo do astra prata, um homem deitado na grama. Estava indo em direção a minha mãe quando um menino passou consolando um muleque que chorava: "minha namorada!!", o outro o acalmava dizendo que ela só estava desmaiada que estava tudo bem. E sairam da cena enquanto alguns gritavam: "não deixa ele escapar, não deixa ele sair daqui!".
Outras meninas que estavam por ali curtindo me perguntavam o que aconteceu. Não sei. Vi minha mãe agachada pegando o pulso da primeira menina, loira, lá pelos 16 anos, piercing no umbigo, jeans colado e a blusa branca rasgata, saltando sutiã. O rosto mal dava pra ver, tinha sangue. Ela não se mexia. Dois espasmos, vomitou sangue. Outro procurou a bolsa dela e achou seu celular. "Aqui tem o número da casa dela". Pedi para que ele não ligasse. Dizer o que? Sua filha esta aqui estendida na Brasil. Uma outra enfermeira de pronto socorro chegou, pegou o pulso dela, viu a situação: "ela está tendo parada respiratório". Falou pra minha mãe: "olha, quase sem pulso. precisava de uma massagem cardíaca. Mas não tem aparelho"...
"Está em óbito, corre, vamos ver a outra alí". E quem estava ali em volta foi até o segundo corpo. Estava bem, gemendo de dor. Pedindo pra que soltasse a cabeça dela. Em volta as pessoas que viram repassavam a história: "ele estava fazendo zigue-zague, não acreditei que ia bater". "Ele atropelou elas, estavam na calçada". "Elas foram jogadas pra fora do carro". Destas, a última era verdade. "Tá viva, tá viva": gritaram do outro canto se referindo aos pés debaixo do carro, sobre a calçada. Este último não era verdade... Toda a massa cefálica desta última estava na calçada.
Chegou o resgate e tudo melhorou. Logo após o corpo de bombeiros. Evacuaram tudo. Todos gritavam pra eles deixarem a primeira menina, ignorar ela lá, não mecher na primeira menina, corre e olha a segunda que é a única viva, corre... E ali ficou um corpo, sem vida, mas com pai, mãe, irmã e amigos. Ninguém sabia quem era. Mas em alguem outro lugar, sabe-se lá exatamente aonde e com quem, estava minha irmã, da mesma idade, com a mesma vida frágil sujeita a qualquer coisa. E se algo acontecesse a ela, nessa hora ela ou qualquer pessoa estaria na calçada. Emergência é emergência. E estômago é pra quem tem tem. "Duas estão mortas". "duas não, acho que as três". "Uma tinha quatorze anos". "A outra tinha 17". "O menino estava dirigindo". "Você ouviu o barulho". "Fatalidades acontecem". "O que aconteceu, moça?".
E meu estômago não aguentou.

5 comentários:

Emil disse...

Puxa Gabi!!! Foi uma experiência muito forte.

Seu relato está bem feito, é impressionante notar a reação das pessoas.

Abraço,

E.

PIRES DI LEITE disse...

Como é a vida né?
Nesse exato momento eu estava na casa do seu pai comendo um pexinhu e nadando na piscina.
Gabi, por pior que seja a experiência, eu não acredito em coincidências...
Acredito que seu espírito tenha evoluído... sei lá..
Utão..

=/
..

G.G. disse...

espero que pelo menos vc tenha gostado da casa...

coincidencia?
depende de vc.

PIRES DI LEITE disse...

e tem como não gostar da CASA.
Vc reparou q eu escrevi CASA em maiúsculo pra lembrar que o imóvel é beeeem maiúsculo! hahaha
Seu pai está de parabéns!
A CASA é show!!

=]

G.G. disse...

Tinha mesmo que ficar, neh?
Afinal, ele vendeu a ALMA por isso.
=p