quinta-feira, dezembro 06, 2012

O Discurso do Método - Anotação II e magia dos livros usados...

"Enfim, para a conclusão dessa moral, decidi passar em revista as diversas ocupações que os homens exercem nesta vida, para procurar escolher a melhor; e, sem que pretenda dizer nada sobre as dos outros, pensei que o melhor a fazer seria continuar naquela mesma em que me achava, isto é, empregar toda a minha vida em cultivar minha razão, e adiantar-me, o mais que pudesse, no conhecimento da verdade, segundo o método que me prescrevera. 
Eu sentira tão extremo contentamento, desde quando começara a servir-me deste método, que não acreditava que, nesta vida, se pudessem receber outros mais doces, nem mais inocentes; e, descobrindo todos os dias, por seu meio, algumas verdades que me pareciam as mais importantes e comumente ignoradas pelos outros homens, a satisfação que isso me dava enchia de tal modo meu espírito, que tudo o mais não me tocava. Além do que, as três máximas precedentes não se baseavam senão no meu intuito de continuar a me instruir: pois, tendo Deus concedido a cada um de nós alguma luz para discernir o verdadeiro do falso, não julgaria dever contentar-me, um só momento, com as opiniões de outrem, se não me propusesse empregar o meu próprio juízo em examiná-las, quando fosse tempo; e não saberia isentar-me de escrúpulos, ao segui-las, se não esperasse não perder com isso ocasião alguma de encontrar outras melhores, caso as houvesse
E, enfim, não saberia limitar os meus desejos, nem estar contente, se não tivesse trilhado um caminho pelo qual, pensando estar seguro da aquisição de todos os conhecimentos de que fosse capaz, julgava estar seguro da aquisição de todos os verdadeiros bens que alguma vez viessem a estar em meu alcance; tanto mais que, não se inclinando a nossa vontade a seguir ou fugir a qualquer coisa, senão conforme o nosso entendimento lha represente como boa ou má, basta bem julgar, para bem proceder, e julgar o melhor possível para proceder também da melhor maneira, isto é, para adquirir todas as virtudes e, conjuntamente, todos os outros bens que se possam adquirir; e, quando se está certo de que é assim, não se pode deixar de ficar contente." - Descartes

A dor e a delícia de saber, e saber mais =]

Pensamento que me ocorreu lendo o livro: o comprei em um sebo, então há resquícios de leitura de outra pessoa, como trechos sublinhados. A parte legal de pegar livro riscado é que a gente acaba prestando atenção no trecho que chamou atenção de outra pessoa. No mundo das idéias , este pensamento já estava latente para ela. No caso, a parte em negrito era o que estava marcado por esta pessoa.
 
O leitor anterior buscava alguma comprovação de Deus, já que trechos onde a fé estava em evidencia e a existência de algo superior era argumentada. Eu vou terminar o livro quase com a certeza de que não vou acreditar no mesmo Deus que esta pessoa vê e encontra evidências de sua existência, no mesmo livro que leio, onde eu encontro evidencias para outros assuntos - mas nada divino.

Lemos o mesmo trecho, mas a mim o que esta sublinhado saltou aos olhos... Mesmo prestando muita atenção no texto em negrito para captar a mesma mensagem especial ao outro leitor. As vezes relia para tentar entender o enigma, e mesmo assim não achei nada que saltasse aos olhos. E se você prestar atenção, nós entendemos mensagem quasde que opostas considerando o mesmo trecho de livro - e não foi por incoerencia do autor:
  • O leitor anterior descobriu um Deus que o ajuda em seu caminho, conforta e dá luz.
  • Eu achei uma busca desesperada e sozinha pela verdade, onde não se confia na verdade de outros homens e meu pensamento deve estar acima de tudo.
Poderia dizer que todos nós temos cabresto voltado para nosso eu - e eu não sei dizer até quanto isso é escolha e até quanto é puramente cultural e depende de nossa história e interação com o mundo... Porque nenhuma interação é plena, absorvemos só a parte que entendemos.

Dá pra entender, não sei se aceitar, porque discutimos veracidade de fatos todos os dias em quase todos argumentos - o mesmo fato ocorre iou é entendido diferente em cada pessoa. Fatos não podem ser recursos argumentativos por si só. O povo sabe, o pior cego é aquele que não quer enxergar. Mas quem enxerga? 

Os mais precipitados dirão Deus.

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